Untitled Document
 
Untitled Document
Untitled Document

Prazer: guarda-chuva

14/11/2011

Centro para Crianças e Adolescentes faz jornada autobiográfica em sala; processo estimula alunos a se conectarem com suas histórias e experiências pessoais

Ele entra em silêncio. Passa pela educadora e por alguns olhares curiosos, mas ninguém diz nada. Entre um esbarrão e outro nas mesas, ainda meio sem jeito, procura seu lugar. Procura um lugar na sala, já que o lugar de cada um é a própria sala. Toda. Sem marcações. E os olhares continuam atentos. E as conversas, em voz baixa, especulam os motivos daquele objeto tão comum, e incomum para um sol para cada um lá fora, em suas mãos. Dentro da sala. Em breve todos saberiam o motivo. Mas a explicação filosófica, digamos, sairia de outro canto da sala, que até então não havia entrado na história.

Quando a educadora Juliana Garcia, do Centro para Criança e Adolescente – CCA, contou que um dos alunos havia levado um guarda chuvas para a sala, foi exatamente essa cena que se desenhou para abrir a matéria. Tire aí uma ou outra coisa, mas não a parte dos olhares curiosos, e será, provavelmente, aquilo que aconteceu. A proteção que é caçada como tesouro em dias de chuva pesada, aqui, era apenas parte de um trabalho autobiográfico que os meninos e meninas do Módulo Amarelo do CCA andam fazendo nesse segundo semestre de 2011. Assim como as outras salas do programa, o Amarelo mergulhou nas histórias de vida como estratégia para trabalhar a arte no cotidiano dos alunos. Começando por trechos da biografia de Elvis Presley e reflexões em sala de como construímos nossa história, o desafio era construir para o próximo dia 19, sábado, para os pais, uma grande instalação, uma grande obra de arte.

O trabalho de estimular os adolescentes a trazerem pertences que ajudassem a dizer quem eles eram não foi uma tarefa fácil, conta Juliana. "O maior desafio no começo do trabalho foi fazer os meninos entenderem que não era para trazer algo que fosse bonito, que plasticamente chamasse a atenção, mas sim para trazer algum objeto que fosse importante para a vida deles, para sua história". Passada essa etapa, conta a educadora, foi a vez de fazer uma reflexão sobre como a nossa rotina diária mesmo ajuda a moldar quem somos. "O cotidiano é cheio de objetos pelo nosso caminho. A gente é que cria valores sobre eles, constrói relações. E com o passar do tempo esses objetos passam a dizer muito sobre a gente, ou ser parte de trechos importantes de nossas vidas", diz.

Feito o pedido, trazer coisas que falassem sobre eles, o primeiro item a chegar foi uma guarda-chuva. A explicação foi obvia, direta: "Eu não paro de carregar esse negocio para cima e para baixo para a minha mãe. O dia inteiro. Logo, eu tenho uma relação com ele, né, professora", conta sorrindo Juliana, ao se lembrar da cena. Mas a explicação simplista, e verdadeira do aluno que levou o guarda-chuva não convenceu a todos da sala. Um aluno filosofou, lá do outro canto da sala: "Não é por isso só. é que ele te protege. Eu vejo isso quando olhei pra ele. - E a conversa começou sobre o tema e nunca mais terminou", lembra Juliana.

Desse episódio até agora muita coisa aconteceu. E muitas coisas entraram e saíram do Módulo Amarelo, sempre com explicações afiadíssimas de o "motivo pelo qual esse objeto está aqui é...". De objetos mais simples a triciclos, de tudo já apareceu. E tudo virou material de estudo, de reflexão sobre a história que essa turma está construindo, e sobre o que já viveram até aqui. As conversas não param nunca sobre o tema e são estimuladas por atividades passadas pela educadora à turma.

Os objetos trazidos têm ficado em sala de aula, onde os adolescentes estão os pintando para que eles deixem de ser simplesmente "uma coisa", para ser um objeto de arte. Conta Juliana que "a turma está trabalhando aplicando tinta branca para tirar toda a informação que existe nos objetos. Depois disso, eles vão ter que pensar quais elementos são necessários para ajudar a contar a relação deles, alunos, com o objeto trazido. Por exemplo: o que precisa ter de desenho, colagem, no guarda chuva para que ele deixe de ser, apenas, um guarda chuva, e passe a dar a ideia de senso de proteção, dito durante a aula?! Esse é o desafio dessa turminha a partir de agora".

O trabalho de montagem da exposição / intervenção, está sendo feito de forma coletiva pela classe, mas a curadoria, o como tudo isso será apresentado no dia 19 para os pais, ainda não foi decidida pelos meninos e meninas do Amarelo. Mas como contar a história de toda uma classe, respeitando a biografia de cada um? Existem formas, diz a educadora. Às vezes há um elemento comum a todos. "Até um triciclo foi trazido, e rapidamente abraçado pela turma toda como sendo um objeto importante e comum a todos. Por isso ele deve ganhar uma atenção especial na exposição. Representa a turma inteira", revela.

Para Juliana, trabalhos como esse estimulam o desenvolvimento de várias habilidades nos adolescentes, e essa necessidade de contar sobre a vida sempre esteve presente na turma. Só precisava de um empurrãozinho. E foi isso que aconteceu. "Os meninos sempre trouxeram muita informação sobre a história de vida deles, sobre a importância das experiências que vinham tendo em casa, na escola. O que a gente fez foi estimular esse "falar sobre" e organizar essa história, usando a ludicidade para isso", finaliza.

E fiquemos ansiosos. Dia 19 Já bate à porta com uma super exposição.

 Na rede

Sobre o CCA

Calder By Campo Limpo

Próxima parade: Monterrey

 

 

 

 

 

 

Untitled Document